domingo, 14 de outubro de 2007

Zodíaco ( **** )


Menos é (muito) mais

Sempre é muito bom acabar de ver um filme e logo constatar que o seu diretor evoluiu. Acontece isso com Zodíaco, sexto e até agora melhor obra de David Fincher, cineasta que tem muitos fãs dedicados a espalhar o qual geniais filmes como Clube da Luta e Se7EN são (não concordo) e dono de um currículo curioso, mas talvez superestimado.

Voltando a abordar uma caçada a um serial killer, mas de um jeito totalmente oposto ao mostrado em Se7en, Fincher constrói aqui o filme mais pé-no-chão e contido de sua curta, mas eficiente, carreira. Baseado numa história real, Zodíaco presta mais atenção aos seus personagens e a atmosfera social da época do que a joguinhos e finais chocantes, e seu diretor também deixa de lado os ataques videoclípicos e os efeitos de câmera tão impressionantes quanto distrativos, presentes no filme com o Brad Pitt e o Morgan Freeman, e também em O Quarto do Pânico e Clube da Luta.

Vai ver é a maturidade. Mas não se enganem: a quantidade de efeitos especiais presentes aqui é absurda e quase imperceptível: do sangue jorrando do pescoço de uma vítima que recebeu um tiro, aos cenários em si – como uma rua-, as trucagens estão aqui a serviço da história, coisa que está se tornando mais rara nos últimos lançamentos vindos lá de cima.

O orçamento generoso permite uma reconstituição de época que funciona perfeitamente, cheia de pequenos detalhes e atores muito bem caracterizados,e o elenco é um achado. Jake Gyllenhaal faz cara de curioso e assustado como ninguém, e é o personagem com quem o público se identifica mais, afinal também ficamos um pouco obcecado pela figura do assassino,mas há também muita curiosidade sobre Robert Downey Jr., ator muito capaz e que defende bem um jornalista talentoso, mas cada vez mais refém do álcool- troque isso pelas drogas, e Downey Jr. sabe bem o que fazer. Mas, se for pra escolher uma só atuação, fico com a do Mark Rufallo, que expõe bem a frustração do seu personagem, um detetive da polícia de São Francisco que dedica anos de sua carreira perseguindo o maníaco do título.

Em linhas gerais,posso afirmar que o filme é curioso e fascinante por três motivos: é feito com tecnologia de ponta, mas com visual bem saudável e que não deixa transparecer os zilhões de 0s e 1s que existem por trás de cada imagem –sim,estou elogiando a fotografia digital e os discretos efeitos especiais. Um outro ponto é que, sinto muito para todo mundo, o mistério do "Zodiac killer" permanece (quase) em aberto até hoje, e a frustração e a curiosidade dos personagens se estendem a nós espectadores, que nos tornamos investigadores desse caso nada agradável, onde todo mundo na rua era uma vítima em potencial de um assassino sem rosto- portanto, um bicho-papão urbano,de meter medo em qualquer marmanjo. E, por último, acho curioso como o filme, que poderia ser mórbido e macabro –e o é por breves momentos- consegue ser tão excitante e prazeroso de se ver. Resumindo: Fincher deixou a mão pesada em casa, e direcionou sua pretensão para outros canais, e nós agradecemos.

Zodíaco lembra muito, não apenas pelo lugar no tempo, os filmes americanos da dourada fase setentista, com um roteiro consistente e sem enrolação, econômico e direto, beirando a secura. Muito bom ver um filme de estúdio como esse, inteligente e que faz o espectador acompanhar a narrativa com interesse genuíno. Todo filme, pelo menos os de Hollywood, deveriam ser assim, mas os níveis de qualidade e satisfação vêm baixando drasticamente. Triste constatar isso, e assustador também, afinal filmes como esse aqui – digamos, para um público adulto e exigente- estão cada vez mais raros, e as porcarias de sempre, com roteiros abaixo da crítica – vide os exemplos óbvios que são as duas continuações de Piratas do Caribe- infelizmente andam fazendo, mais do que seria o recomendado,um sucesso estrondoso, levando o público às salas como zumbis, sem questionamento algum.

Então Zodíaco se torna duplamente nostálgico:sentimos saudade não só da época em que os contatos eram mais humanos e um mistério, uma lenda urbana, tinha que ser resolvida sem a ajuda do google e afins, pro bem e pro mal, e também da época em que o que importava para que um filme fizesse sucesso não eram coisas como o marketing e os truques de computador, mas a paixão e dedicação destinada à história, para o envolvimento de nós, pobres espectadores cada vez mais carentes de novos filmes bons.


Zodiac
/ David Fincher/ 2007/ (2:35:1)

2 comentários:

Anônimo disse...

Adoro aquela cena do início, com os fogos do ano-novo...

Bom comentário sobre os efeitos especiais, são gritantes mesmo... Mas são usados com intenções tão boas, que sirva de lição para o abestalhado do Robert Rodriguez...

Por falar nisso, o que é A Prova de Morte, não é minha gente?

João Daniel disse...

Death Proof é massa,e merece ser visto, de verdade, numa telona. Mas esperar ,sem certeza, por 2008 é fueda,hehehehe


E aí,curtiu Godzilla dessa vez?

:P